7.2.10

JLT: A letra Kapa ...é das mais esbeltas.

7-2-2010


“Meu maior medo é acordar um dia e descobrir que fui abandonado pela poesia” II - José Luís Tavares, poeta

A proposta da oficialização do crioulo, apresentada pelos deputados do PAICV, foi rejeitada no Parlamento. Enquanto o PAICV pugnava pela aprovação como forma de valorizar a língua cabo-verdiana, o MpD e a UCID contrapunham que neste momento não estão criadas as condições necessárias para a sua oficialização. A deputada Filomena Delgado da bancada do MpD afirmou em declaração de voto que " não trás nenhum ganho para o país oficializar neste momento a língua cabo-verdiana para se continuar a utilizar na Educação, no Boletim Oficial nos outros documentos oficiais a língua portuguesa. Qual o posicionamento de José Luís



Tavares sobre este capítulo da oficialização da língua cabo-verdiana que nunca mais termina?

O meu posicionamento é o mesmo dos últimos anos, sendo que já fui contra e reticente, mais por desconhecimento do que por uma posição reflectida e esclarecida, o que me faz acalentar a esperança de que com informação e esclarecimentos suficientes muitas barreiras e equívocos serão ultrapassados.

Sou pela oficialização plena e em paridade com o português, ainda que, no meu entendimento, se esteja a apegar demasiado à questão formal, legal e constitucional. Não menosprezando o aspecto da dignidade constitucional, penso que o actual articulado permite um conjunto de realizações e cujas virtualidades estão longe de estar esgotadas. O que é preciso é levar à prática, e até às últimas consequências, todas as possibilidades legais existentes. E para isso é preciso que o próximo governo, seja ele de que partido for, tome de forma decisiva a questão em mãos transferindo-a para o ministério da educação (com um ministro com abertura, empenho e sensibilidade para a questão, sem prejuízo do papel que o ministério da cultura deva continuar a ter), pois é aí que se joga, decisivamente, o sucesso na aprendizagem e uso da língua caboverdiana; a criação de uma unidade de missão adstrita à presidência do conselho de ministros, enquanto não é criado o instituto da língua caboverdiana, uma das principais recomendações do fórum de dezembro de 2008. Bom, dir-me-ão, para isso tudo é preciso haver recursos. Então tenho de relembrar que Cabo Verde não deixou de lutar e alcançar a sua independência quando o mundo inteiro entendia que havia outra solução mais fácil. Estou convencido que da próxima vez que a questão da oficialização for a votação, e é desejável que seja num quadro de revisão extraordinária, pois ela não pode ser objecto de barganha política, como parece ter sido o caso último, ela terá o apoio unânime daqueles que nos representam no parlamento. Não acredito que exista um único caboverdiano consciente que seja contra a dignificação da sua língua materna. Daí que nem o chumbo da oficialização ontem é a derrota de uns e a vitória de outros, nem a oficialização amanhã será a vitória destes e a derrota daqueles. Enquanto a nossa língua for mantida num patamar de inferioridade somos todos nós os derrotados; e no dia em que ela atingir a plena paridade com o português a vitória também será de todos, mesmo daqueles que tardam em compreender essa necessidade e a justeza dessa reivindicação. Esta é uma questão civilizacional que me lembra aquele ditado que diz que conhecer uma língua faz de nós humanos, mas conhecer duas faz de nós civilizados.

Acha que há alguma mão oculta preterindo a oficialização da língua cabo-verdiana e por que razão?

Eu não sei se há uma ou mais mãos ocultas ou não, mas o que eu tenho notado é que existem algumas movimentações, sem que isso possa ser tomado como algo conspirativo, e que elas incluem cabo-verdianos e não-caboverdianos. No que tange aos caboverdianos que são contra a oficialização, podemos dividi-los em várias categorias. Uns, por um déficit de consciência cultural e identitária; outros por razões de poder, pois enquanto o português continuar a ser a única língua formal de Cabo Verde aqueles que possuem o seu domínio ficam na posse de um capital social e simbólico não negligenciável; outros ainda por razões de reivindicação regionalista que encontraram um pretexto para as suas, talvez, justas queixas, usando a questão da língua como cobertura; e ainda aqueles que, se calhar por culpa nossa, não fazem ideia sequer do que se está a discutir. Em caso algum os defensores da oficialização devem hostilizá-los ou chamar-lhes nomes, pois as nossas energias devem ser colocadas ao serviço de acções positivas, tendo sempre a consciência que é mais penoso e ingrato o trabalho de quem quer construir. É preciso usar a força dos argumentos científicos, persistente e incansavelmente, e nunca cair na tentação do chiste, do menosprezo ou de imputações carácter pessoal em relação a quem tenha opinião contrária.

Quanto aos estrangeiros as suas contribuições são bem-vindas, desde que se restrinjam ao âmbito técnico-científico. A questão social e política é com os caboverdianos, e só com eles. Por isso espantei-me, e muito, quando me disseram que um jornalista caboverdiano teria perguntado ao ex-ministro português Morais Sarmento o quê que ele achava da oficialização da língua caboverdiana. Que eu saiba o senhor Sarmento não é linguista e Cabo Verde é um estado soberano há trinta e cinco anos. Choca-me que haja caboverdianos que ainda não tenham interiorizado isso e que agem perante lisboa como se ainda fôssemos uma das suas possessões ultramarinas.

A questão do ALUPEC e das variantes não têm abonado a causa do crioulo. Porque não oficializar, por exemplo todas as variantes, e, porque não optar por um alfabeto etimológico que, ao que parece, é mais consensual?

A questão do ALUPEC e das variantes, para aqueles que são contra a dignificação da língua caboverdiana, é apenas um pretexto e um expediente. Se não fossem estes, seriam outros. Mas também há muita gente que é levada a crer que a oficialização seria a imposição de uma variante hegemónica, ou até, no limite, o banimento do português. Se eu suspeitasse sequer de algo parecido com isso, seria o primeiro a rebelar-me contra tal barbaridade. Isto leva-nos a uma outra questão, que é a da comunicação. Sem querer tomá-lo como bombo da festa, o que parece estar muito na moda, tenho de dizer que o ministério da cultura comunica mal, descura esse aspecto fundamental nas sociedades contemporâneas hiper-mediatizadas, e então numa questão deste melindre e sensibilidade o primeiro aspecto que se deveria ter em conta era esse, e desde o início estar entregue a um organismo especializado, pois onde há desconhecimento e ignorância há terreno propício a todo o tipo de manipulação e distorção, inclusive da parte de pessoas cujas funções, independentemente do direito sagrado à opinião e do entendimento acerca dos méritos deméritos do alfabeto caboverdiano, é aplicar as directivas do governo da república. Se existem soluções técnica e cientificamente mais consistentes e com maior aceitação social, elas que apareçam, que empenharei a minha palavra de escritor na sua valorização e afirmação. E àqueles a quem estão incumbidas responsabilidades políticas e governativas nesta matéria, que procedam com toda a transparência de modo a afastar qualquer sombra de suspeição em relação a qualquer desígnio regional, pessoal ou de grupo, para que aqueles que patriótica e desinteressadamente se encontram engajadas nesse processo e nessa caminhada não se sintam por vezes instrumentalizadas. Quanto ao alupec/alfabeto caboverdiano ser controverso, eu não vejo contovérsia lá onde ela importava, isto é, no campo científico: de um lado há estudos, pesquisas, trabalhos, propostas, ainda que com as suas lacunas e insuficiências, e do outro lado o quê que vemos? A evocação de uma suposta idade edénica em que tudo era fluidez e harmonia (não se escusando de invocar, capciosamente, os nomes daqueles que com os instrumentos possíveis tentaram dar dignidade ao crioulo, e que se fossem vivos corriam-nos a varapau), os mesmos argumentos inoperantes à luz da ciência linguística, assim como à face da didáctica e da pedagogia das línguas, e até face às recomendações da Unesco em relação à padronização e escrita das línguas ágrafas e semi-ágrafas. Não quero com isso dizer que o alupec seja um instrumento perfeito, acabado e definitivo, mas, convenção por convenção, como também é o caso da etimologia, ainda que com a força duma convenção naturalizada, prefiro aquela que simplifica sem que se perca nada de linguisticamente relevante nessa simplificação. Acerca deste ponto específico convém relembrar, como está provado, que a humanidade evoluiu através da lei do menor esforço. Por tudo isto acho que o alupec é um bom instrumento, passível de melhoria e aprofundamento e de uma melhor socialização, ou, em alternativa, aqueles que discordam em absoluto têm o dever de propor um outro modelo coerente com a especificidade da nossa língua, e com base nas mais recentes aquisições da ciência linguística, sobretudo daquele ramo que se debruça sobre as línguas de contacto, como é o caso do nosso. Já que falamos em aperfeiçoamento, parece que uma das maiores reservas é na representação do som [k] que foi convencionado representar uniformemente pela letra K, para mim uma das mais esbeltas do nosso alfabeto. Como utilizador abalizado quero avançar aqui uma proposta, não por razões linguísticas, mas práticas, que pode fazer diminuir alguma resistência ao uso desse instrumento: o uso exclusivo desse grafema para representar o som K instala uma certa monotonia visual e gráfica e pode tornar a leitura um pouco menos fluída, daí que talvez fosse desejável que nas palavras onde houvesse a ocorrência de mais de um som [k] o segundo som fosse sempre representado pela letra C, desde que a vogal imediatamente a seguir não seja E ou I. Assim também resolver-se-ia o angústia daqueles irmãos nossos muito preocupados com a saúde e com a possibilidade de, em sendo necessário, o médico ficar impossibilitado de lhes receitar vitamina c, como se nesse contexto o C não fosse apenas um símbolo como o Delta, Gama ou Pi, que não fazem parte do alfabeto latino, porém são usados, ou o W o K e o Y que só com o recente acordo ortográfico entraram para o alfabeto português. Não me consta que alguma vez se tenha deixado de colocar placas na estrada com a indicação de distância em quilómetros (km) pelo facto de a letra K na altura não fazer parte do alfabeto português.

Por sua vez o acordo ortográfico entrou em vigor em Cabo Verde e ninguém se ralou. É a favor do acordo e como consegue explicar esta aparente contradição: a oficialização da língua cabo-verdiana voltou a ser adiada para as calendas gregas, por não reunir consenso, e o acordo ortográfico da língua portuguesa é aceite pacificamente.

A questão é deveras pertinente e deve ser colocada àqueles que se opõem a que a nossa língua de berço seja colocada num outro patamar, com os instrumentos próprios e autónomos para os quais muita gente tem trabalhado incansavelmente nestes últimos 35 anos. Eu nesta matéria sou de toda a coerência, daí ter publicado já em 2008 no Brasil um livro, Lisbon Blues, que adoptava parcialmente a nova grafia do português, sobretudo no que tangia à eliminação das consoantes não articuladas, e neste novo livro há incorporação plena dessas normas, sendo um dos primeiros autores a fazê-lo em livro em todo o espaço da lusofonia.

Que pergunta gostaria o JLT de colocar ao JLT?

Pergunta: Qual o seu maior medo? Resposta: o do poeta, acordar um dia e descobrir que foi abandonado pela poesia. O do homem não é para aqui chamado.

7-2-2010, 10:53:42

Ler original li sin AM, Expresso das Ilhas

2 comentários:

  1. JLT< N gosta txeu des bo entrevista. ate agora dakes poke pesoa e ke ja-m inkontra ta da un resposta sinples sobre inplementasaun de un ortografia pa tude variante de nos terra. To the point y sen pretensau. ate ta parse ke nen tude ta pirdide nes debate sobre nos linga. bos argumente foi sen imusuan negative, sima ja-m ten kestume de prezensia o de algun protagunista o antagunista des tema/debate. Obrigada pa es lisaun.

    Guy Ramos - Rotterdam - Olanda

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  2. Guy Ramos, kontinua atentu... N sta djobe entrevista di Skritor Germano Almeida, ki tanbe ta fala di Lingua Kv...
    Si nho sta txeu interesadu nho konsulta kes blogs Li:http://odiaquepassa.blogspot.com/
    http://coral-vermelho.blogspot.com/2010/02/crioulo-versus-portugues.html

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