11.3.12

Matuta, nos identidade...


talvez à luz de:

1. " A identidade não se compartimenta, não se reparte em metades, nem em terços, nem se delimita em margens fechadas. Não tenho várias identidades, tenho apenas uma, feita de todos os elementos que a moldaram, segundo 'dosagem' particular que nunca é a mesma de pessoa para pessoa." p:  10

2. "Em cada homem se reencontram pertenças múltiplas que por vezes se opõem entre si e o obrigam a escolhas dolorosas." p: 12

3." «obrigadas a escolher», «incitadas», disse eu.  Incitadas por quem? Não apenas pelos fanáticos de todas as bandeiras, mas por si e por mim, por cada um de nós. Por causa, justamente, desses hábitos de pensamento e de expressão tão enraizados em cada um de nós, por causa dessa concepção estreita, exclusiva, preconceituosa, simplista, que reduz a identidade inteira a uma única pertença, proclamada com raiva.
É assm que se «fabricam» os autores dos massacres, apetece-me gritar! (...)" p: 13

MAALOUF, Amin. As Identidades Assassinas. ??

"(...)
A questão identitária cabo-verdiana voltou ao de cima; voltou a estar na ordem do dia. Isto por causa do reforço da componente ideológica que o partido do Governo, de forma sibilina, mas persistente, vem impondo à Nação, desde há uma década.
Nesta estratégia enquadram-se muitos programas, projetos e ações, de âmbito geral ou sectorial, levados a cabo pelos departamentos governamentais ou com o seu beneplácito e a que, lamentavelmente, a sociedade cabo-verdiana vem dando o seu aval, incautamente.
Para mim, a questão é, contudo, simples: somos mestiços. Mestiços fisicamente, mestiços espiritualmente.
Dir-me-ão que mestiços há muitos. É verdade! Porém, temos especificidades próprias, que nos identificam, caracterizam e distinguem como povo e como Nação.
Não está em causa saber se somos mais africanos ou mais europeus. A nossa localização geográfica e o facto de sermos um país arquipelágico, também favorece[ra]m a mestiçagem. Somos pretos e brancos, numa combinação cujo produto tem um valor acrescentado. Numa operação em que o resultado é mais do que a simples soma dos fatores.
Todavia, o que me preocupa, hoje, é ver jovens, que vivem ou viveram nos Estados Unidos da América e no Brasil, a querer transpor, à viva força, para Cabo Verde, os traumas que as populações de raízes africanas ainda vivem nessas sociedades e que já estavam ultrapassados, em Cabo Verde, faz tempo.
Chegamos ao ponto de ter que ouvir o porta-voz de um dos seminários do "Encontro de Quadros", realizado no ano passado no Mindelo, relatar ao plenário que o seu Grupo de Trabalho chegara à conclusão que não existe uma música cabo-verdiana. Tal afirmação foi difundida pela comunicação social e, até hoje, não li nem ouvi qualquer reparo à mesma.
Ou seja, não queremos assumir a nossa mestiçagem na sua plenitude; nas suas componentes africana e europeia e nas suas vertentes física e espiritual. Mais do que isso, pretendemos ainda renegar a síntese ininterrupta, enriquecedora e exemplar, que os nossos antepassados, tão perfeita e sabiamente, souberam iniciar e produzir e que justificou e legitimou, afinal, a nossa emancipação.
Não admira, pois, que um ilustre representante do Instituto da África Ocidental (IAO), sediado na Praia, venha agora dizer-se escandalizado com a maneira como as mulheres cabo-verdianas se vestem.
Tivessem os cabo-verdianos dado atenção e enfrentado o combate que uma ideologia castradora nos vem impondo, nomeadamente, em matéria de identidade cultural, e não estaríamos, agora, nesta situação de ouvir prédicas do estilo. (...)" [bold nosso]

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